Em outubro de 2023, a Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL) emitiu uma nota técnica que recomenda o tempo máximo de tela para crianças. A entidade de especialistas sugere uma hora por dia para crianças com idades entre dois e seis anos, evitando integralmente o acesso para menores de dois anos. O documento tem como base mais de 30 referências bibliográficas, entre estudos, teses e pesquisas publicadas sobre o tema pelo mundo.
De acordo com o documento, a criança pequena, principalmente a partir do primeiro ano de vida, faz ‘mapas’ cerebrais dos sons das palavras que escuta no ambiente, associando-as ao seu significado. “Se há um aparelho de televisão sempre ligado, um rádio sempre ligado ou uma música sempre ligada, a criança poderá ter dificuldade em construir esses ‘mapas’, pois só consegue registrar o que ouve claramente”, afirmam os autores. Portanto, conversar e ler para o bebê desde os primeiros dias de vida, sem ruído de fundo, é uma forma simples e comprovada de aumentar a sua inteligência.
“As interações sociais exercem papel fundamental no desenvolvimento cerebral ao longo da vida, repercutindo no aprendizado de linguagem, na capacidade cognitiva e até mesmo na constituição psíquica do indivíduo”, destaca o médico otorrinolaringologista e foniatra Gilberto Bolivar Ferlin Filho, do Hospital Paulista de Otorrinolaringologia. Nesse contexto, a forma como os pais ou cuidadores interagem, a qualidade dos diálogos, as brincadeiras e leituras afetarão diretamente a taxa de aquisição e o desenvolvimento da linguagem, sobretudo nos primeiros três anos de vida.
Fala e sedentarismo
De acordo com o médico, o atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem é frequente em bebês que ficam passivamente expostos às telas por períodos prolongados. “Estudos sugerem que essa exposição excessiva pode reduzir a interação verbal entre os pais e as vocalizações naturais das crianças, afetando as interações familiares que contribuem para o desenvolvimento da fala e da linguagem”, acentua. Portanto, essa exposição afetaria o conhecimento de novas palavras, a formação de estruturas de frases e a compreensão da expressão.
O uso excessivo de celular, computador, tablet, videogame e televisão também está associado a sedentarismo, obesidade, falta de concentração, isolamento social, distúrbios do sono, ansiedade, depressão e irritabilidade. Portanto, essas questões desafiam pais e educadores na missão de criar oportunidades de as crianças explorarem o mundo real e as interações multissensoriais que as cercam. “É uma missão difícil e, por vezes, desleal, tendo em vista o enorme grau de atratividade das mídias eletrônicas”, acentua o especialista. No entanto, é preciso insistir para evitar os prejuízos que podem se manifestar futuramente.