A dermatite atópica (DA) é uma doença inflamatória crônica da pele que ocorre em indivíduos geneticamente predispostos. Com sintomas como lesões e coceira nas áreas afetadas, a manifestação envolve interações complexas entre o sistema imunológico, fatores ambientais (como alérgenos, irritantes e poluição) e disbiose intestinal. Além disso, evidências recentes sugerem que a composição alterada da microbiota na pele e no intestino pode contribuir para a patogênese da condição. Dessa forma, os estudos sugerem que o eixo intestino-pele pode desempenhar um papel crucial na dermatite atópica.
Para compreender como essas interações influenciam o desenvolvimento da dermatite atópica, pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade de São Paulo (USP) publicaram um artigo de revisão que pode fornecer fundamento para novas abordagens terapêuticas. Dentre as evidências foram relatadas alterações na estrutura do microbioma intestinal em pacientes com DA quando comparados a indivíduos controle.
A microbiota dos pacientes era caracterizada pela abundância de Clostridium difficile, Escherichia coli e Staphylococcus aureus, bem como pela diminuição de bactérias produtoras de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), entre as quais Bifidobacterium e Bacteroides. “Os ácidos graxos de cadeia curta desempenham papel crítico na manutenção da saúde do hospedeiro e, quando sua produção é reduzida, pode levar à inflamação intestinal em indivíduos com dermatite atópica”, relatam os autores.
Trabalhos recentes também se concentraram na identificação de variações genéticas relacionadas à suscetibilidade e gravidade da DA. Por meio de estudos de associação ampla do genoma (do inglês, Genome Wide Association Studies – GWAS) foram identificados marcadores genéticos relacionados à DA, incluindo mutações no gene filagrina (proteína associada a filamentos que se ligam às fibras de queratina nas células epiteliais), descrita como fator de risco mais bem estabelecido para a doença. Outros achados descobriram marcadores de suscetibilidade adicionais e interações gene-ambiente.
Segundo os autores, a revisão fornece uma visão geral de estudos recentes que investigam o impacto da microbiota intestinal e da epigenética no desenvolvimento e progressão da DA. Embora existam evidências de interações entre o genoma do hospedeiro e o microbioma intestinal com a doença, permanece indefinido se os microbiomas disbióticos são determinados geneticamente. “Portanto, novas investigações são necessárias para esclarecer os mecanismos moleculares latentes aos efeitos protetores de certas espécies bacterianas e metabólitos contra a doença”, enfatizam.
Prevalência
Também conhecida como eczema atópico, a dermatite atópica afeta entre 7% e 10% dos adultos e até 25% das crianças, de ambos os sexos e residentes em áreas urbanas. Pesquisadores destacam que os principais fatores de risco estão associados a genética, autoimunidade, comprometimento da integridade da barreira cutânea, infecções virais, alterações na composição da microbiota intestinal, hábitos alimentares e estilo de vida. Sem tratamento adequado, a doença pode evoluir para casos graves como, por exemplo, neurodermite, infecções de pele e complicações de visão.
Terapêuticas
A revisão analisou, ainda, abordagens terapêuticas com evidência científica para a dermatite atópica. Alterações epigenéticas, por exemplo, têm sido investigadas como potenciais alvos terapêuticos. “Pesquisas mostram que mudanças na diversidade microbiana intestinal podem ser moduladas por dieta, prebióticos e probióticos”, informam os autores. Outra possibilidade promissora é o transplante de microbiota fecal que, de acordo com estudos experimentais em humanos e animais, poderia restaurar a microbiota intestinal e o equilíbrio imunológico, ao mesmo tempo que suprime as reações alérgicas associadas à DA.
Embora o mecanismo exato permaneça incerto, os investigadores suspeitam que uma microbiota desequilibrada contribua para a inflamação e respostas imunológicas observadas nesta doença inflamatória crônica da pele. O artigo ‘The interaction between the host genome, epigenome, and the gut–skin axis microbiome in atopic dermatitis‘ foi publicado em 2023 no International Journal of Molecular Sciences – doi.org/10.3390/ijms241814322.